RELATO PARALISIA DO SONO (O Visitante Sombrio)

Não sei exatamente quando aconteceu, mas suponho que no primeiro episódio eu tivesse menos de dez anos, pois foi quando eu ainda dividia o quarto com meu irmão quatro anos mais velho.

A primeira coisa que me vem à cabeça é que ainda era noite, pois estava escuro e quieto. Lembro que havia uma fresta na cortina através da qual entrava uma certa luminosidade. O quarto não estava um breu total, acostumando os olhos por tempo suficiente, era possível discernir os móveis e objetos no quarto. Na época, minha família vivia em um apartamento de segundo andar, e a janela dava para os fundos de um prédio vizinho, onde havia uma luz de rua sempre acesa.
Lembro de ter acordado em um sobressalto, possivelmente de um outro pesadelo. Estava tudo muito tranquilo, e me recordo perfeitamente de ter tentado virar para dormir novamente, mas por alguma razão não consegui fazê-lo. Os braços pareciam estar dormentes, pesando uma tonelada. Eu sentia como se estivessem formigando (e esse foi um detalhe que lembrei recentemente!). Apesar de estranho, isso não chegou a me preocupar muito, talvez porque eu estivesse apenas parcialmente consciente.

O que realmente me intrigou foi que eu tentei coçar nariz, mas não conseguia por mais que quisesse. Só então me dei conta de que não conseguia me mover. Braços, pernas, cabeça... nada! Apenas piscava os olhos sem entender o que estava acontecendo, mas não me importava especialmente com aquilo. Até então era apenas estranho.

Foi então que tive aquela sensação esquisita. Me desculpem, mas não tem como explicar decentemente. É algo que apenas quem experimentou isso consegue entender e por mais que se tente explicar (e estou batalhando com o teclado para achar as palavras) não há como descrever. Não é um arrepio ou um tremor involuntário, tampouco é aquela sensação na boca do estômago causada pela ansiedade. Na ausência de qualquer outra palavra que possa exprimir a sensação, é um terror invisível, sem forma, motivo, razão.

Não se compara aos sustos nossos do dia a dia, ou aos medos que sabemos ter e com os quais estamos habituados a lidar... é algo mais profundo. Como uma apreeensão irracional vinda de lugar nenhum. A sensação não começa de repente e vai crescendo (e disso me recordo com exatidão). Você salta da tranquilidade direto para o sentimento de ameaça plena, perigo real e imediato, no qual sabe intuitivamente que alguma coisa está ali com você. Eu não me recordo de ter sentido medo de morrer, não era esse tipo de medo, era como ter medo de "ver" alguma coisa inesperada saltando do escuro. Sabendo que "ver" essa coisa, seria mil vezes pior do que morrer. Apesar de ter consciência disso, eu não conseguia fechar os olhos ou pedir ajuda, embora meu irmão estivesse dormindo ali, poucos metros na cama ao lado.

Uma das coisas que crianças fazem é tentar puxar a coberta sobre a cabeça para se esconder e não ver o que está acontecendo. Mas não tinha como... com braços pesados e o corpo imobilizado tudo o que restava era olhar.

O mais curioso é que eu não vi nada. Nada ao menos que pudesse ser visto mas, nossa, eu podia sentir que alguma coisa estava ali comigo. Acho que eu não preciso explicar como é a sensação de imaginar estar sendo observado, todo mundo já deve ter sentido isso e virado bruscamente, olhando por sobre o ombro esperando encontrar alguém próximo. Foi a mesma coisa, mas multiplicada por mil vezes e com o agravante que eu não podia virar. Não é algo agradável... nem um pouco! 

Eu dormi novamente e na manhã seguinte imaginei que aquilo tinha sido só um sonho ruim. É engraçado que mesmo quando criança tentamos racionalizar as coisas e como à luz do dia, tudo de ruim que acontece à noite, perde seu impacto. Mas é claro, quando anoiteceu eu fiquei com temor de que aquilo acontecesse de novo e o inoportuno visitante viesse novamente. 

Mas não... o visitante sumiu, só retornando anos mais tarde e esse segundo caso foi bem mais estranho.

Acho que eu devia ter uns 12 anos e já tinha meu próprio quarto em outra casa. O incidente seguiu mais ou menos o mesmo roteiro do primeiro:

Acordei de madrugada, e descobri que meus braços e pernas estavam paralizados. Havia aquela sensação de formigamento em todo o corpo e por mais que eu tentasse, não conseguia me mover. Tudo o que podia fazer era mover os olhos de um lado para o outro. Eu lembro de fazer uma força enorme para tentar me virar, mas os músculos pareciam travados, como quando a gente se esforça demais fazendo exercícios, passa da conta e fica exausto demais para prosseguir.

Fiquei ali não sei quanto tempo, o formigamento continuava se espalhando e quando eu tentava ordenar que meus braços se movessem senti aquela sensação desagradável de que não estava sozinho. Era idêntica ao primeiro caso, mas dessa vez havia um fator a mais. Eu sentia um frio danado, como se a temperatura do quarto tivesse despencado vertiginosamente. E isso em uma noite quente no Rio de Janeiro. O frio era tanto que eu batia o queixo sem parar. Não sei porque correlacionei o frio com aquela presença mas bastou isso para que o temor aumentasse.

Foi então que vi - ou pelo menos acho que vi, uma figura escura, tão escura que tudo que eu conseguia ver era sua silhueta na penumbra. Parecia estar de costas para a janela, voltado para a cama. Ficou inerte por um bom tempo e apesar de eu não ter percebido olhos ou uma expressão, sabia que ele estava olhando fixamente na minha direção. Era incrivelmente escuro, como uma sombra, mas quando me apeguei a essa esperança ("É só uma sombra... só uma sombra e nada mais!"), ele se moveu bruscamente, se ajoelhando. Eu fechei os olhos e tentei chamar ajuda, mas não havia som possível. Quando abri os olhos ele estava mais perto, parado do lado da cama, imóvel como antes, mas eu só conseguia vê-lo pelo canto do olho, pois o ângulo não permitia mais do que isso .
Eu sabia que ele estava bem próximo, como se estivesse esperando alguma coisa. Parecia indeciso, como se não tivesse certeza se eu estava acordado ou não, se o estava vendo ou não. Me recordo também de ouvir estalos no quarto, não eram passos, mas estalos secos como se alguém estivesse pisando em gravetos que quebravam. Sei que é loucura, mas é do que lembro. A forma escura ficou ali me encarando, não fez nada, não ouvi nenhum murmúrio, palavra ou ruído vindo dele. Não ouvi qualquer coisa além do som dos meus dentes batendo e dos ocasionais estalos que desviavam minha atenção. Não sei quanto tempo durou tudo aquilo, mas no fim, acabei simplesmente dormindo.

Na manhã seguinte eu lembrava de flashes do que havia acontecido, como se tivesse sido um pesadelo. Por algumas noites fiquei esperando aquilo acontecer novamente. Eu evitava passar pela sala da nossa casa à noite, e em mais de uma ocasião tive a impressão de ver alguma coisa parada num canto escuro observando. Mas é claro, não era nada.

Talvez seja a lembrança desse incidente que faz com que eu deteste até hoje chegar em casa de madrugada e acender a luz, imaginando que ao fazê-lo vou flagrar alguma coisa escondida num canto, alguma coisa que vai se dissipar imediatamente, mas que por um breve momento, por um piscar de olhos, eu vou ver claramente.

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