VAMPIROS (Parte 2)





A estaca e a cruz

Não há ainda muito tempo que existiam os «caçadores de prêmios» para os quais o vampiro era uma presa natural. Entre as duas guerras mundiais, na aldeia de Pirenil, Podrina, o mágico muçulmano que aí vivia, recebeu mil dinares para destruir um vampiro. Do mesmo modo que em todos os lugares rurais da Europa, o padre cobrava muitas vezes a proteção religiosa que encarnava. Em nome de Cristo muitos erros se cometeram, e a caça ao vampiro degenerou muitas vezes em autênticos massacres de inocentes: «Em 1837, na aldeia de Derknoi, na Rússia, um estrangeiro acabado de chegar tornou-se suspeito para os camponeses e, tomando-o por vampiro, torturaram-no queimando-o em seguida. As pessoas desta região pensavam que apenas de noite estes monstros apareceriam», escreve Tony Faivre.
As mais estranhas crenças nasceram deste medo ao «morto vivo». Assim, gentes do povo germânico consideravam que as crianças que tivessem no corpo alguma mancha avermelhada teriam inevitavelmente de ser «vampiros», mas sob uma forma muito peculiar; sem apresentar aspecto tenebroso. Depois da vida terrestre, diz a lenda, virão como borboleta branca que, pousando sobre o peito de quem dorme, daí extrairão o derradeiro fôlego, o que asfixiará a vítima.

Em Vestefália o vampiro raramente toma a forma de um morcego, mas sim de borboleta. Estas materializações surpreendentes nada têm a ver com o vampiro de carne e osso, vestindo os seus próprios fatos impecáveis, freqüentando os meios mundanos de todas as épocas.
Para as tradições esotéricas, não restam dúvidas: só o duplo, o «corpo astral» do morto tem o poder de agir para além da morte. O corpo não sai nunca do túmulo. E sim a energia do defunto que, por razões desconhecidas, se manifesta ainda depois da extinção das funções vitais.
Destruir esse duplo: tal seria o alvo a atingir pela estaca aguçada que entra pelo peito do vampiro.
Os padres ortodoxos respondiam quase sempre da mesma maneira às superstições. «Que se deite água benta sobre os túmulos, que se abram as sepulturas e se queimem os cadáveres, para que o medo se afaste de toda a aldeia.»
Na Bulgária, era uso o padre erguer a imagem de um santo cristão por cima do defunto, e, pegando nu ma garrafa com sangue, obrigava o vampiro a entrar dentro dela. Depois atirava a garrafa ao fogo.
Na Sérvia, o sacerdote dirigia-se ao cemitério acompanhado pelos camponeses apavorados, tirava o caixão do túmulo, deitava palha por cima, atravessava o corpo do defunto com uma estaca de espinheiro e queimava-o. Em seguida, dizia: «O demônio não virá atormentar mais ninguém.»
A meio do século XVIII, o medo instalou-se um pouco por toda a Europa. Tudo é possível acontecer, desde suspeitar-se das sepulturas, não vão elas servir pa- ra dissimular presenças diabólicas do além túmulo...

Em cada país o clero arranja uma estratégia para combater esses seres da noite e para fazer face aos mortos-vivos, que parece começam a invadir a Europa Central.
«Os sacerdotes», escreve J. L. Degaudenzi, «celebram missa durante os nove dias que se seguem à inumação».
Ao décimo dia, se a epidemia continua desenterra-se o corpo, transporta-se à capela, arranca-se-lhe o coração por entres nuvens de incenso. Também as vísceras são queimadas e tudo o que resta do broucolaque. Em Milo as coisas não se passavam de maneira muito diferente, a avaliar pelo relato de Ricault, em 1679. Uma pessoa excomungada foi, diz ele, enterrada em local distante da ilha de Milo, onde pouco tempo depois surgiram manifestações espíritas. Tudo se preparava então para abrir o túmulo, desmembrar o corpo, ferve-lo em vinho, quando a família deste, enviando dinheiro ao Patriarca de Constantinopla, pediu que lhe fosse levantado o castigo. No momento do levantamento, perante a perplexidade de quem assistia, e sete anos após estar enterrado, o corpo desfez-se por completo.
A partir de 1824 o trespassar de cadáveres acabou, embora se mantivesse o enterrar de criminosos e suicidas nas encruzilhadas dos caminhos, para evitar que se tornassem «vampiros» infestando lugares sagrados.
O Código Penal russo previa no seu artigo 1472.º: «Ao suicida não é concedido um enterro religioso.»
Abrir os túmulos e mutilar os cadáveres estava previsto no artigo 234.2 do mesmo Código.


A transformação em lobo

Nas crenças e lendas do vampirismo, o morto-vivo não tem apenas o poder de se transformar em morcego. À noite, quando ele sai do túmulo, torna-se lobo... como se à floresta, às montanhas, aos ermos que rodeiam o seu domínio apenas fosse adequada essa forma flexível, também ela feita para a astúcia, essa forma que mata.

Mas o uivo de lobo (que sendo dado pelos cães chamamos vulgarmente o uivo da morte) não é somente um uivar animal. E o instinto, a resposta, assim que o lobo se apercebe do poder oculto e magnético da Lua.
O vampiro-lobo – dizem as lendas – uiva à Lua.
Ele cumpre um tipo de cerimonial gelado. O vampiro que tem o poder de ficar com o aspecto de lobo não é somente um amante da licantropia. Não é um monstro isolado, perdido na noite e entregue à sua forma animal. Ele contém todos os instintos secretos do animal, todos as suas forças... e mesmo para além disso (padres ortodoxos houve que lhe deram certo crédito). Uma vez que ele tem a faculdade de liderar entre os lobos e os morcegos, o reino animal reconhece nele, por instinto, a energia oculta que lhe vem de antes da morte.

A lenda não esqueceu o peculiar poder do vampiro quando fala nos cães uivando à volta de sepulcros e de animais meios enlouquecidos pela presença do morto-vivo. O animal reage primeiro que o homem, porque compreende antes deste o que representa um vampiro. «Quando ele apareceu de repente ao pé de mim», escreve Stoker no Drácula, «eu direi ter ouvido apenas a sua voz elevar-se e tomar um tom de profunda autoridade. Vi-o então a meio da rua. Estendia os longos braços como que para empurrar um muro invisível. Os lobos deixaram de uivar e recuaram lentamente. Nesse momento a Lua foi coberta por uma nuvem e de novo ficamos envoltos em profunda escuridão.» E acrescenta mais à frente: «E contudo, pondo-me à escuta, ouvi lá muito longe, no vale, mais lobos uivar. Os olhos do conde brilhavam e exclamou: ‘Escutai-os, são as criaturinhas da noite, e que música eles fazem!...’»
Homem-morcego, homem-lobo, o morto-vivo tem imensos poderes para se transformar; mas o mais estranho é aquele que lhe permite desmaterializar-se quase totalmente, tomando a forma etérea de um raio de lua ou de um simples pirilampo.
Este fenômeno é dos mais complexos. Trata-se de um ponto de energia minúsculo, de uma intensidade incrível. Um pouco como certos pontos negros do tamanho de uma cabeça de alfinete e que aspiram tudo o que os rodeia nos espaços intersiderais.
E o poder final do vampiro. Assim, o vampiro não possui apenas um corpo mas vários. É pois impossível dar-lhe um único nome, ou atribuir-lhe um só aspecto.
Quem é o príncipe Drácula? Um fantasma de forma imprecisa, toda feita dessa «coisa» a que se chama vampiro, à falta de outros nomes que se lhe dêem. Mais que um corpo ou uma forma, ele é um conjunto de energias vivas, larvar, que uma vontade forte prolonga além morte.
Hoje em dia, dificilmente se aceita que um ser possa existir para além do túmulo, possuindo o poder de se transformar em lobo, em morcego ou em pirilampo. A superstição tomou conta desta terrífica criatura. Um Barba-Azul da noite, um monstro bebedor de sangue. Seja onde for, ele encarna para nós o medo... o medo da morte.
Nas tradições do mundo da magia, afirma-se que o poder do vampiro depende unicamente da sua vontade. Mas essa vontade nada tem a ver com as vontades humanas, pois ela não habita um corpo vivo. A superstição diz que os vampiros apenas saem em noites de Lua cheia, como se a sua atividade noturna dependesse essencialmente daquele astro.
Tratamos de voltar atrás, às antigas civilizações, para compreender bem a importância do seu culto dedicado à deusa Istar que, como Hécate, representa o aspecto mágico da Lua.
Sobre uma tábua da Caldeia, conservada no Museu Britânico, pode ver-se o traçado da epopéia mitológica. Relata-se aí a descida de Istar ao país dos mortos.
Chegada às portas da morada infernal, chama e pede sob ameaça: «Abre a tua porta senão saltarei a vedação, galgarei os montantes e farei que os mortos se ergam para devorar os vivos, e que venham a exercer sobre estes o seu poder.»
Para os mágicos de Nivive, Istar reina entre os morto-vivos, isto é, sobre os que venceram a morte. Tal como a todos os que a veneravam como toda poderosa, assegurava viverem sempre na morte.
Depressa as crenças populares afirmaram que os defuntos podiam vencer o túmulo se tivessem desejo de sangue de um vivo. Do mesmo modo que, na mitologia grega, Eurípides representa Aquiles numa armadura dourada, em pé sobre o túmulo, bebendo sangue de uma virgem sacrificada em sua glória.
Mais lamentáveis parecem ser esse tipo de vampiros, mulheres feiticeiras da Roma antiga que tinham a faculdade de se transformar em aves de rapina para vir saborear sangue humano. «Vistas durante a noite atravessando os céus, e sem que nem as portas ou fechaduras as detivessem, iam estrangular as crianças e devorar-lhes o fígado.»
Os partidários do culto da magia mergulham no fascínio do sangue porque se sentem vulneráveis, ameaçados como todas as formas de vida terrestre. O batismo do sangue para o vampiro é ao mesmo tempo blasfêmia e perversão. Deve agir como armadura e protegê-lo contra a morte.
E como uma imitação do batismo de luz, do sacramento do Espírito Santo, ligação indissolúvel entre Deus e o homem.
«Revesti-vos de Cristo», clama S. Paulo aos Romanos.
A imagem do túmulo ilumina-se de outra forma. A luz é vertical, cai como um projetor potente e elimina todas as obscuridades.
Segundo os evangelistas, Cristo visitou os mortos: «Também aos mortos foi anunciada a Boa Nova, a fim de que, julgados segundo os homens na carne, eles vivam segundo Deus no espírito.»
O vampiro nega a ressurreição. Ela pretende pegar a morte com o seu próprio punho, com a ajuda do seu querer pretende escavar a sua cova no inferno e aí fazer a sua morada, sem o auxilio de Deus.



Os crimes do Barão Brecy

Os sortilégios do vampirismo não morrem tão facilmente como se possa pensar.
Ainda há poucos anos um inquérito fez deslocar certos inspetores às ruínas do castelo de Brecy de Sologne. Os velhos habitantes da aldeia de Brecy falava de um barão vampiro, rondando as ruínas e apavorando toda a região. Não muito longe do castelo, encontrou-se o corpo de Guillemette H. com o ventre e as pernas dilaceradas como se tivesse sido desfeita com algo de metal, com o peito e os rins dilacerados, com as costelas e vértebras partidas. A rapariga tinha sido violada mas debatera-se ferozmente, como o provava as unhas partidas e a roupa rasgada.
Os inquiridores descobriram uma profunda marca, sobre o ombro, marca essa feita sem dúvida com a fivela de um cinturão do assassino. «Um motivo de me tal em relevo com um diâmetro de cinco centímetros que podia representar vagamente uma cabeça de animal... talvez de um leão», cita um cronista.
No chão, à volta do cadáver, nem um só vestígio do assassino.
A família acompanhou os agentes encarregues desta investigação até ao posto da polícia, onde estes consultaram enorme documentação com o fito de encontrarem improváveis culpados, maníacos ou desequilibrados sexuais.
O inquérito pouco mais além poderia ir. Um homicida misterioso viola uma rapariguita, mutila-a e desaparece sem deixar vestígios.
Mas para os velhos da aldeia, os que de tudo se lembram, o assassino não andaria por muito longe, embora talvez já fora do alcance da justiça. Duas mulheres encorajando-se mutuamente, resolveram sugerir desde o começo do inquérito que se desse uma olhadela pelo prado, perto do sítio do crime, acrescentando com ares misteriosos que esse caminho cruzava o lugar do «senhor punido».
Nesse lugar – conta Claude Seignolles –, há séculos mataram e enterraram os despojos do senhor da região, homem belicoso, combatente em várias guerras, patrão severo, exigente e impiedoso para com a sua gente, como se eles fossem seus inimigos e que, forçados, acabaram por sê-lo. Um corajoso e hábil lenhador, encontrando-o adormecido junto a uma árvore num dia de imenso calor, abriu-lhe a cabeça com forte machadada. Mas, mesmo morto, o rancor continuava a viver nele, a ponto de sair do túmulo uma vez em cada século, indo procurar vingança durante algumas horas por aquelas paragens. Isto, se se der crédito aos antigos aldeões...
O cabo da polícia dirigiu-se ao local indicado pelas mulheres como sendo o lendário sítio do túmulo. O terreno aparentava um abaixamento que o polícia observou, e esse abatimento de solo, com ervas e em forma de retângulo, podia bem ser uma cova mortuária. Logo o cabo da polícia trouxe um dos investigadores ao local da descoberta. Mas uma vez chegados lá encontraram o chão completamente raso, o que fez espantar de tal forma o polícia que perguntava a si próprio se estaria com a cabeça a andar à volta devido à violência do crime e a começar a ver coisas onde não existiam na verdade. Rondando o solo, enterrava o pé, atraído pela curiosidade, somada a certa excitação que o relato das duas aldeãs lhe teria provocado. Fez sentir uma ressonância, justamente no sítio onde imaginara o túmulo.
Foram imediatamente requisitados dois cantoneiros para escavarem. O terreno estava macio, a pá e picareta não tardaram a fazer o trabalho e depressa apanharam um osso comprido que os homens, com as mãos, acabaram de desenterrar. Tratava-se de uma tíbia! Um osso que, de tão sólido, eles não se arriscaram a quebrá-lo! Depois seguiram-se a rótula e o fêmur de uma perna forte, em perfeito estado de conservação. Um crime descobrindo outro.
Desprendemos os membros inferiores de um longo esqueleto antigo... depois, subindo um pouco, uma espessa bacia, as mãos grandes e abertas com falanges de tamanho impressionante. Um dos utensílios com que se escavava bateu numa coisa de metal que com cuidado raspamos. Era o plastrão de uma armadura de bronze, que tinha ao meio, em relevo, o brasão da pessoa a quem pertencera, um leão apoiado nas patas traseiras. A rapariga violada fora atingida por um objeto metálico com o mesmo motivo do brasão do barão de Brecy, adepto de ciências demoníacas, excomungado pela Igreja sete séculos depois...
Como se vê, muitos destes senhores «vampiros» partidários da necromancia tinham sido excomungados pela Igreja. A excomunhão era a prova de que eles pertenciam às legiões da noite. Eram temidos e nenhuma terra abençoada aceitaria os seus despojos ainda que, em Paris, se tivesse construído especialmente um cemitério para todos os rejeitados pela Igreja, fossem eles adeptos do diabo, fervorosos praticantes da magia negra. No começo do século passado, este cemitério abandonado servia de templo fúnebre a todos os mágicos de magia negra, patrícios do vampirismo ou de outros deuses infernais. Uma verdadeira aldeia vampiresca na Rua de Flandres, em plena Paris.
René Schwablé, aderente também às ciências ocultas, descreve este diabólico cemitério em Chez Satanaz, obra que surgiu em 1913.

«Encontrareis no 44 da Rua de Flandres uma grande e velha construção com dois portões largos, abertos para um pátio enorme, circundado por cavalariças e abrigos. Entrai através de um corredor úmido, escuro, até encontrar uma porta pesada cuja fechadura ferrugenta precisa de ser arrombada a murro. Por detrás desta velha porta existe uma pequena floresta virgem, entre dois muros altos com fendas. Encontram-se aí mais ou menos vinte e cinco túmulos dos quais dois ou três estão em bom estado ainda, mas os outros completamente escavacados. Cruel, a vegetação levantou as campas, impeliu as lages, partindo as pedras, revolveu os caixões. No tempo de Luís XIV eram aí enterrados os hereges, uma vez que não podiam ser inumados em necrópoles públicas.
Os locais de vampirismo e de práticas negras passam despercebidos ao profano. Contudo, basta empurrar uma porta oscilante, saltar um muro de alguma ruína, descobrir um cemitério abandonado, para que a lenda desperte do seu mundo de cinzas, vista os seus fatos de terror e desça às ruas do nosso bom velho século XX.
Os lugares malditos são a morada das perseguições fantásticas. A pedra reteve em si todos os dramas, todos os terrores. A vegetação está doente, a pedra está carcomida pela lepra e uma impressão de mal-estar salta aos olhos como veneno.
O exorcismo romano pode santificar a pedra e dissipar os miasmas da noite. Depende tudo espiritual do exorcista. Pode ficar extenuado do seu combate, naufragar na sua loucura. Para afrontar maldições é necessário a virtude e a correção luminosa dos ascetas plenos de Espírito.
Nenhum exorcista orou sobre as ruínas do castelo de Brecy. Aí se mantém portanto toda a sua carga maléfica.
Os monges do Oriente opunham o sangue do mártir ao sangue dos sacrificados da magia. Então o panorama maldito transfigurava-se como aconteceu com o frade Thalélaios, monge sírio, que, retirando-se para o deserto, combateu todas as noites homens e mulheres vampiros que interceptavam as suas orações e reclamavam-lhe o sangue. Pela força da sua oração tudo se transfigurava: é por isso que esta terra que estava noutros tempos submissa à impiedade e aos demônios, renunciou ao seu erro ancestral para enfim acolher o clarão da luz divina. Servindo-se das suas mãos ele fez cair por terra os templos dos demônios e edificou um santuário aos vitoriosos mártires opondo aos falsos deuses os corpos divinos. Sangue por sangue. Os ascetas sabem que a carne é insensível, lenta e pesada, como a sepultura. É o Espírito que ilumina que transfigura e rouba à morte.


Os principais locais do vampirismo


O mais conhecido dos locais da velha religião da noite é, sem qualquer espécie de dúvida, o castelo de Drácula – pelo menos o que dele resta – em Curtea de Arges, nas montanhas da Transilvânia. Mas há também outros sítios onde a lenda se fixou profundamente. O pequeno porto de Cruden Bay, na Escócia, é um desse estranhos sítios. Foi aí, no país de Stevenson, que Bram Stoker então pertencente à sociedade secreta Golden Dawn concebeu a sua obra prima: Drácula.
A descrição feita por F. Riviere aquando da viagem de regresso de Cruden Bay, acerca do cenário alucinatório, permitirá a Bram Stoker invocar o «príncipe dos vampiros».
«Eu tinha reservado um quarto na famosa estalagem de Kilmarnock Arms, estalagem essa onde Stoker, depois de uma refeição farta, recebera a visita do anjo do mal naquela cama em que as dores de estômago o tinham obrigado a dar voltas sobre voltas no decorrer de um pesadelo...
»Devo dizer que o edifício ao Sol poente deixaria bem impressionado qualquer apreciador de filmes diabólicos da Hammer! Estava lá tudo: a fachada estilo Tudor, a hera trepadora, o pórtico carregado de ornamentos, os vitrais dissimulando por certo inquiridores olhares, a pesada porta de pregos cravados e um gato preto cuja silhueta sinistra se perfilava sol um céu encarniçado.»
O castelo de Krasznahorka é outro local de terror nas montanhas da Hungria do Norte, onde repousariam os despojos de uma mulher vampiro morta há mais de duzentos anos.
Há mais de cinco séculos fora propriedade da antiga família Bebek. Istvan Bebek, antepassado da família, era um simples pastor na altura das invasões dos tártaros, pelo ano de 1241. Um dia, quando apascentava o seu rebanho na montanha de Som, encontrou certa quantidade de ouro escondido e uma pedra com um aspecto singular.
Esteve para deitar tudo fora, mas logo se lembrou de que os filhos gostavam de brincar com coisas brilhantes. Depois, em casa, apercebeu-se de que a estranha pedra brilhava de noite. Conta-se que tornou a ficar com ela dando em troca, aos filhos, qualquer brinquedo preferido, e que se servia da pedra para iluminar a casa, como se se de uma tocha se tratasse.

Um mercador que por lá passou, vendo a candeia do pastor, ofereceu por ela cem dinares. Bebek não tinha falta de dinheiro mas, como gostaria de comprar uma vaca que lhe desse bom leite, esteve quase a fechar o negócio.
Os filhos tanto se lastimaram e choraram com a idéia de se privarem da pedra mágica que Bebek rejeitou o negócio, dizendo que resolvera não a vender.
A notícia depressa se espalhou. Os proprietários dos arredores não deixavam de massacrá-lo por causa da pedra. Temendo ser morto por causa desse tesouro, resolveu levá-lo ao rei Bela IV e oferecer-lhe. Coincidiu com o momento em que os Tártaros se retiravam, deixando atrás de si tudo destruído a ferro e fogo. Para o rei, este presente chegou na hora certa, era o maior diamante que este já vira, pelo que perguntou a Bebek o que queria que ele lhe desse. Prometei-me unicamente sete currais construídos nas minhas terras, Majestade.
O rei acedeu de bom grado. Bebek partiu, e com o ouro que guardara construiu sete castelos. E assim que apareceram os castelos de Torna, Esnek, Solyomk, Pelsóc, Szádvár e Krasznahorka.
Os descendentes do pastor foram considerados aristocratas e fizeram de Krasznahorka residência d família... até 1575, quando Péter Andrássy ocupou o lugar de governador do castelo.
Sua mulher, a jovem Zsófia Serédy, era uma apaixonada das práticas negras. A biblioteca do castelo transbordava de obras de ocultismo e nas noites de Inverno Krasznahorka recebia artistas e praticantes de magia, da Hungria, os que se lembravam ainda as exacções de Vlad Drakul – o príncipe Drácula – de Hermann e de Bárbara de Cillei. Os sortilégios romenos reavivavam à luz de tochas, nas salas do andar inferior do castelo. Zsófia Sérédy morreu de embolia durante o assalto ao castelo, feito pelo seu próprio filho Jancsi, para esmagar, terá ele dito: «esse feudo de magia negra».
Ainda hoje, numa das divisões do castelo de Krasznahorka, se encontra, deitada num caixão de vidro uma bonita senhora! E ela Zsófia Sérédy. Eis como passados duzentos anos ela dorme, sem que em pó se tenha tornado! O cadáver é exibido como fenômeno pois que se mantém como tendo morri do no dia anterior.
De tempos a tempos o vestido fica feito em pó. Voltam a vesti-la com outro fato preto. Ela, porém, continua imperecível.
É também curioso assinalar que o seu antebraço direito, imobilizado ao morrer, mantém-se um pouco elevado e com um dos dedos hirto como fazendo qualquer sinal.
Porquê esse sinal? Que quereria ela dizer nos seus últimos momentos de vida? Conta-se por lá toda a espécie de coisas, mas esta é de todas a mais espantosa... Os praticantes da velha magia turca reconhecem-se através deste sinal, ao qual Von Sebottendorf, grão-mestre da Sociedade Thule e amigo de Bram Stoker, já aludira.
O índex esticado corresponderia a fogo. Von Sebottendorf afirma que «conjugado o A –que faz nascer o elemento líquido – com I que se forma com o indicador estendido, permitirá ao discípulo ultrapassar os limites da morte, em plena consciência. Alcançar pois a Imortalidade!»


Vlad-Dracul

Senhor da Valáquia

Na Transilvânia, a uma altitude vertiginosa acima de uma paisagem selvagem, toda florestas e ribeiros, eleva-se uma cidadela inacessível onde, enclausurado voluntariamente, vivia noutros tempos um príncipe...
Este solitário não tinha senão um único fim: transpor os limites da morte e entrar vivo na eternidade. Drácula, eis o nome deste amante das ciências malditas. Nosferatu, isto é: o «não morto», aquele que não morre nunca.
Como ele, outros senhores poderosos transformaram os seus castelos romenos em ninhos de águias, ficando discípulos do Anjo Negro, Lúcifer. Esses sim, praticam o verdadeiro vampirismo, alquimia do sangue e da morte.
Nosferatu pode escrever-se só no plural porque não há só um nosferatu. Se Drácula, o príncipe Vlad Drakul, cuja história romena recorda, é considerado como o soberano dos adeptos da noite, ele não é único «não morto». Outros pertenceram ou ainda pertencem a essa cadeia onde os segredos do sangue se transmitem do mestre para o discípulo.
Os vampiristas conhecem o ritual de chamamento à vida, o ritual do despertar que se pode encontrar no Livre Sacré d’ Abramelin le Mage. Foi a partir deste manuscrito que formou a primeira cadeia dos «não mortos» que se espalharia pela Europa inteira.
No âmbito da magia e terror tal como se passa com os elfos2[10], os papões, as fadas, o lobisomem etc., nós vimos o vampiro aparecer com rara constância nas lendas e tradições populares. No entanto, a lenda não é somente uma «crença popular», uma vaga superstição de que nos lembramos. Ela pertence sempre a uma realidade esquecida, temerosa.
A história revela-nos que o conde Drácula não era conde mas príncipe e que reinou em Valáquia, província dos Cárpatos,de 1456 a 1462. É também conhecido pelo nome de Vlad Tepes, o que quer dizer vlad o empalador. O historiador Florescu descreve-o como especialista em empalamento e tortura, homem sanguinário e destemido guerreiro.
«Ele empregava», escreve ele, «estacas e lanças que precisavam ser afiadas, para que as perfurações não provocassem imediata agonia e antes intensificassem o sofrimento dado o tipo de chaga alargada que daí resultava.»
A Romênia – especialmente a Transilvânia de século XV tem a marca do vampiro. Tudo, desde a busca mágica do príncipe Drácula, a criação da Ordem do Dragão por Segismundo I da Hungria que se tornou ponta de lança da cavalaria das trevas, uma ordem vampírica a que toda a aristocracia da Transilvânia aderiu, os Drácula, os Garai, Cillei e outros, tudo ali existe.
A crueldade de vlad ficou na lenda.
«Ele foi vlad Tepes, o tirano. Nada o satisfazia tanto como ver os seus inimigos no estertor e sofrer quando empalados. Conta-se que no meio dos moribundos suspensos de estacas ele se fazia servir das mais lautas refeições, para mostrar que o espetáculo cruel e a forma de matar os inimigos não lhe roubava o apetite.» (F. R. Dumas.)
Em Târgoviste ele empalou, na Páscoa de 1459, quinhentos Boyards. A 24 de Agosto de 1460, os anais da Romênia precisam que ele matou – após torturas e suplícios – 30 000 prisioneiros em Anilas:
«Assassinou alguns fazendo passar por cima deles os rodados de carros. A outros, despojando-os das suas roupagens, arrancou a pele até às entranhas. Assou alguns sobre brasas, atravessados por espetos e a tantos perfurava-lhes as nádegas com estacas que saíam pela boca... e parra que nada fosse esquecido, quanto a atrocidades possíveis, espetou, a uma mãe, os dois seios colocando-lhe por cima o filho ainda bebê.»
Enfim, matou de muitas e diversas maneiras, torturando com a ajuda de utensílios, fazendo atrocidades que só o mais tirano dos tiranos poderia conceber.
O papa Pio li ficou horrorizado. O bispo d’ Erlau, em 1475, secundou a acusação de que o número de vítimas do príncipe Drácula se elevava a mais de cem mil pessoas.
Sendo ele cristão ortodoxo, a sua excomunhão tê-lo-ia atirado para os infernos! E não foi citado que, após ter conquistado Kroonstadt, fez dos seus habitantes prisioneiros levando-os para a capela de S. Jacques, para a Igreja de S. Bartolomeu e para o mosteiro de Holtznetya onde, depois de roubar os paramentos e os cálices, deitou fogo aos edifícios com as pessoas lá dentro, matando todos os que ali se encontravam.
Com a aparição de um tal Eleazar, chegado do Egito, detentor do famoso Manuscrito de Abremelin, é que tudo afinal começou...
Uma seita do Egito revelou-lhe os mistérios da morte e as técnicas que permitiriam obter-se um aspecto de imortalidade. Chegado a Veneza, transmitiu para a escrita tudo o que ouvira da boca de Abramelin, no Egito. É em Veneza que põe em prática a sua ciência sobre os mortos... de um modo eficaz e terrífico. Alguns jovens mais ousados agruparam-se à sua volta e formaram o primeiro elo desta cadeia européia. Este saber vinha das práticas de Osíris, o deus dos mortos-vivos do Egito, aquele que foi desmembrado antes de se tomar imortal.
Nas primeiras páginas do manuscrito maldito, Abramelin revela através da escrita de Eleazar: «Imagina a que ponto a nossa seita se tornou maldita que ultrapassa o gênero humano... de tal modo que em ti , não se manterá para além de uns setenta e dois anos... e outra virá continuar-lhe caminho.»
O discípulo de Abremelin deixou Veneza, onde ficou um grande número de partidários que se instalou na ilha de Lagune, ilha essa onde noutros tempos se orara ao dragão das águas, o que prova que nada se escolhe por acaso...
Eleazar chegou à Hungria, onde se tornou conselheiro, em matéria de ocultismo, do imperador Segismundo, iniciando-o nas práticas de Abremelin.
O imperador da Hungria acabava assim de descobrir uma resposta para as suas angústias, um remédio para o seu temor à morte. Aconselhado por Eleazar fundou a Ordem do Dragão na mitologia do sangue.
Vlad o Diabo, príncipe da Valáquia e pai de Drácula, pertencera a esta Ordem, onde foi iniciado nos mistérios do sangue segundo os ritos de Abremelin.
A seguir à morte de Vlad, Drácula subiu ao trono de Valáquia. Segismundo da Hungria doou-lhe as terras, feudos de Almas e Fagaras situados na outra vertente dos Cárpatos e é sob a bandeira do Dragão que ele combate os turcos, depois de prestar vassalagem ao grão-mestre da Ordem.
Na Ordem do Dragão vamos encontrar os grandes adeptos vampiros da Romênia, homens de armas e ao mesmo tempo praticantes da velha magia. As famílias Garai e Cillei, são conhecidas pela sua crueldade e despotismo, autênticas «eminências pardas» do imperador Segismundo. Hermann de Cillei foi o exemplo vivo desta aristocracia infernal!
As relações pervertidas que mantinha com a irmã bárbara tornaram-se do domínio público mas Hermann de Cillei gozava com o escândalo para o qual ele e sua irmã viviam.
Foi nessa altura que Segismundo I tentou a grande experiência do livro de Abramelin. Ele estava apaixonado por Bárbara de Cillei que, ainda nova, cansada pelos seus excessos debochados, acabava de se envenenar.





Postagens mais visitadas deste blog

ENTIDADES III (Entendendo a vampirização II )

UM CASO DE VAMPIRISMO

BREVE INTRODUÇÃO MAGICA III